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Caixa de Pandora - Aula 1

Atualizado: 16 de abr. de 2020

Hoje retomamos o estudo do grego antigo. Para continuarmos com o pé direito, precisamos de três coisas:

  1. termos uma boa dose de motivação (para isso, basta ler o último post);

  2. dispor de algum tempo (e, certamente, teremos tempo de sobra em quarentena);

  3. e, sobretudo, conhecermos muito bem as letras gregas.


Sem as letras gregas, "vemo-nos mesmo gregos" para ler seja o que for nesta língua. Mas nada de desânimo, porque tenho boas notícias para vos dar: o grego não se escreve com hieróglifos egípcios, caracteres chineses ou com o silabário japonês! Nada disso! O grego escreve-se simplesmente com um alfabeto, tal como o português. Agora, está claro, trata-se de um alfabeto diferente do alfabeto latino. Mas nem sequer isto é um obstáculo, porque muitas das letras são muito parecidas. E há uma explicação para isso: os romanos eram tão pragmáticos que se limitaram a imitar as letras gregas para escreverem a sua própria língua. Portanto, se quiserem ter sucesso neste minicurso, toca a estudar muito bem a seguinte tabela.

Como treino, tentem escrever o vosso nome em letras gregas (não se preocupem com os acentos). O meu fica assim: Μαρκος. É ou não verdade que conseguem identificar à vista desarmada, pelo menos, quatro letras das seis que compõem o meu nome? Vão ver: ler e escrever em grego é do mais fácil que há (e, para além disso, é bem bonito)!


Como exercício, conseguem adivinhar quem são as grandes personagens da história grega por trás do seu nome (ignorem, mais uma vez, tudo o que seja acentos e outros tracinhos engraçados)?! Neste conjunto, há de tudo: escritores, historiadores, heróis, políticos, cientistas e até um médico.


1. Ὅμηρος / 2. Ἀριστοτέλης / 3. Αλέξανδρος / 4. Ἱπποκράτης / 5. Ἀρχιμήδης / 6. Πλάτων /

7. Πυθαγόρας / 8. Σωκράτης / 9. Περικλῆς / 10. Εὐριπίδης / 11. Ἡρόδοτος / 12. Θουκυδίδης / 13. Σοφοκλῆς / 14. Αἰσχύλος / 15. Ἱπποκράτης / 16. Ἀχιλλεύς / 17.Ἀριστοφάνης / 18.Φίλιππος


Depois deste esforço inicial, não pensem que se vão ver livres tão facilmente desta bela descoberta que acabaram de fazer. Porque o alfabeto grego é mesmo fantástico! Reparem como o traçado das letras é delicado e harmonioso. E já alguma vez tinham pensado que as vogais foram uma invenção grega? Pois é, os outros alfabetos até à data não tinham vogais. Podem imaginar a confusão que era... Mas ainda hoje há línguas que utilizam alfabetos sem vogais, como o árabe e o hebreu. Vou dar-vos um exemplo. Como narram os Evangelhos, a inscrição no alto da cruz de Jesus tinha a tradução em três línguas (hebraico, grego e latim) da expressão "Jesus Nazareno, Rei dos Judeus".




Comparemos o hebraico e o grego.


ישוע הנצרי ומלך היהודים


Ἰησοῦς ὁ Ναζωραῖος ὁ βασιλεὺς τῶν Ἰουδαίων


As duas palavras a negrito significam "rei". Se as transliterarmos, ficamos com "mlk" em hebraico e "basilêus"em grego. Eu cá por mim aposto que ninguém consegue pronunciar aquelas três consoantes da palavra hebraica de seguida. De facto, os hebreus também não, porque leem "melek". Simplesmente, não escrevem as vogais. Era como se em grego escrevêssemos apenas "βσλς" e ficasse a cargo de cada leitor descobrir as vogais que faltavam! Bem vos disse que estes gregos até facilitaram a coisa...


O alfabeto grego também nos desvenda outros segredos que, possivelmente, até agora nos tinham passado despercebidos. Para começar, a própria designação “alfabeto” vem precisamente dos nomes das duas primeiras letras gregas α (alpha) e β (béta). Também encontramos estes dois nomes em expressões tão variadas como, na zoologia, o macho alfa (o primeiro, o mais importante do grupo) ou, na informática, a versão beta (ainda não totalmente aperfeiçoada).


E, se quisermos dar ao mesmo tempo uma olhadela à última letra do alfabeto grego, podemos reconhecer facilmente um alfa e um ómega no círio pascal, porque Nosso Senhor é o princípio (alfa) e o fim (ómega) de todas as coisas, tal como escreve São João no Apocalipse (XXII, 13):


«ἐγὼ τὸ Ἄλφα καὶ τὸ , ὁ πρῶτος καὶ ὁ ἔσχατος, ἡ ἀρχὴ καὶ τὸ τέλος»




Mantendo-nos no campo litúrgico, já toda a gente viu, num ambão, duas letras que talvez lhe tenham parecido um X e um P. Agora, depois de termos estudado o alfabeto grego, não será difícil para ninguém reconhecer as letras Χ (chi) e Ρ (rhó), que são as iniciais do nome "Χριστός". Segundo a tradição, este símbolo teria aparecido ao imperador Constantino, acelerando a sua conversão.


Para acabar, vejamos ainda outra permanência das letras gregas na nossa iconografia religiosa. Em muitos símbolos, o nome de Jesus aparece abreviado da seguinte maneira "IHS" (em baixo, no brasão do Papa Francisco). Alguém consegue explicar porquê?




Hoje ficamos por aqui. Na próxima terça-feira, continuaremos a estudar a permanência das letras gregas na cultura ocidental. Também perceberemos como o alfabeto grego explica algumas características ortográficas do português e de outras línguas europeias. Veremos igualmente os primeiros testemunhos escritos em grego. Até lá, aproveitem para decorar o alfabeto grego. Quem quiser, pode deixar a transliteração em caracteres romanos dos nomes das personagens históricas gregas nos comentários.





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